Reflexões Sobre a Transformação Societária
O texto tem como objetivo apresentar alguns aspectos relativos à transformação societária, operação essa que pode ser útil ao agente econômico que atravessa momentânea crise econômico-financeira e se encontra, por exemplo, em regime recuperatório judicial. (3 situações que podem gerar crise do agente econômico)
Considerando que as hipóteses de saneamento, reestruturação e reerguimento da empresa, previstas no art. 50, da Lei 11.101/05, não têm caráter exaustivo, a operação societária a seguir examinada pode ser um importante instrumento jurídico-econômico a ser observado no plano e adotado na prática.
O CÓDIGO CIVIL, A LEI 6.404/76 E A TRANSFORMAÇÃO SOCIETÁRIA
As operações societárias são previstas tanto no Código Civil (art. 1.113), quanto na Lei 6.404/76 (art. 220), sendo poucos os textos legais que tratam da importante matéria.
Em decorrência da transformação societária, cria-se novo regime jurídico, altera-se substancialmente o tipo da sociedade empresária, sendo que a mudança estrutural implica necessariamente na adaptação do estatuto ou contrato social, com nova redação, condizente com a nova realidade jurídico-econômica pretendida pelos incorporadores.
Neste tipo de operação a sociedade terá um novo tipo societário, independentemente de dissolução e liquidação de ativos. De acordo com a regra do art. 220, parágrafo único, da Lei 6.404, a transformação obedecerá aos preceitos que regulam a constituição e o registro do tipo a ser adotado pela sociedade.
Destaque-se que a transformação societária modifica por completo a estrutura e as regras da sociedade empresária, sem afetar sua existência, de modo que permanece a mesma pessoa jurídica (a transformação se assemelha a um ato constitutivo, com a diferença de não haver criação de nova entidade econômica).
Inexiste dissolução ou liquidação da sociedade, mas apenas alteração do tipo societário. Mantida imutável, pois, a personalidade jurídica, diante da alteração do conteúdo do estatuto ou contrato social do agente econômico.
Escreve José Edwaldo Tavares Borba sobre a mudança da sociedade:
A transformação muda-lhe as características, mas não a individualidade, que permanece a mesma, mantendo-se íntegros a pessoa jurídica, o quadro de sócios, o patrimônio, os créditos e os débitos
(Direito societário. 12ª edição. Rio de Janeiro: Renovar, 2010, p. 479)
Para implementação do objetivo colimado, necessário o consentimento de todos os sócios (de uma limitada, por exemplo) ou acionistas (de sociedade anônima), salvo se o contrato ou o estatuto forem expressos ao contrário.
O dissidente se pode retirar da sociedade, caso não concorde com a pretendida transformação.
Estabelece a regra do art. 221, parágrafo único, da Lei 6.404/76: Os sócios podem renunciar, no contrato social, ao direito de retirada no caso de transformação em companhia.
A SITUAÇÃO DOS CREDORES DIANTE DA TRANSFORMAÇÃO
Conforme art. 222 da Lei 6.404/76, os direitos dos credores não são alterados, em havendo, de fato, a transformação societária, bem como continuam com iguais garantias em relação à pessoa jurídica, sócios/acionistas ou terceiros.
A regra do art. 1.115 do Código Civil é no mesmo sentido: não há modificação e muito menos prejuízo em relação aos direitos dos credores.
Em caso de abertura judicial da falência da sociedade transformada, só haverá produção de efeitos em relação aos sócios que, no tipo anterior, a eles estariam sujeitos, se o pedirem os titulares de créditos anteriores à transformação, e somente a estes beneficiará (Lei 6.404/76, art. 222, parágrafo único). (pode haver oposição de sócio ao pedido de autofalência?)
É a mesma regra do art. 1.115, parágrafo único, do Código Civil.
A TRANSFORMAÇÃO SOCIETÁRIA COMO MEIO DE RECUPERAÇÃO
A operação societária da transformação é uma das hipóteses, não exaustivas, elencadas no art. 50, da Lei 11.101/05. Portanto, as hipóteses ali elencadas são meramente exemplificativas, podendo haver outros meios recuperatórios. (petição inicial da recuperação judicial)
Cabe ressaltar que, para fins de proposição, aprovação e implementação da transformação societária, diz a Lei 11.101/05 que hão de ser respeitados os direitos dos sócios, bem como os termos das leis de regência. (falência e responsabilidade dos sócios)
Prevista no inciso II de tal dispositivo, a transformação pode ser implementada, visando a tentativa de saneamento e reestruturação do agente econômico que está sob regime recuperatório judicial. Nesse tipo de reorganização estrutural do agente econômico, pode haver melhora no que diz com a administração, bem como redução dos custos operacionais. (alternativas à falência para empresas em crise)
A reestruturação societária, para fins de soerguimento empresarial há de ser prevista no plano, o qual deve ser apresentado dentro do prazo de 60 (sessenta) dias, a contar da publicação a que se refere o art. 52 da Lei 11.101/05, tudo em conformidade com o art. 53 do mesmo texto legal.
Acentua Fábio Ulhoa Coelho que as operações societárias,
Representam instrumentos jurídicos que, por si sós, não são aptos a propiciar a recuperação da empresa em crise. É necessário contextualizá-las num plano econômico que mostre como sua efetivação poderá acarretar as condições para o reerguimento da atividade. Se o devedor pleiteia o benefício da recuperação judicial mencionando genericamente que esta se dará por meio duma operação societária qualquer (‘incorporação da sociedade devedora por outra economicamente bem posicionada’, por exemplo), isso não é minimamente suficiente para demonstrar a viabilidade do plano. É imprescindível que esclareça os lineamentos gerias da operação
(Comentários à nova Lei de Falências e de recuperação de empresas. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 135. Destaques no original)
Alguns doutrinadores, portanto, entendem que a transformação societária, por si só, pode não ser suficiente para que ocorra o soerguimento, a superação da crise empresarial. Necessária a implementação de um conjunto de medidas, não apenas de cunho societário, mas também financeiro e econômico. (crise e recuperação da empresa)